Uma imagem em preto e branco, embaraçada e pouco compreensível. De vez em quando eu via alguma coisa, alguma forma conhecida, uma forma pouco conhecida, na verdade (parecida com um ETzinho). Dentro daquela sala fria olhava aa imagens, mas não conseguia compreender de fato, o que era aquilo. O que era aquela imagem!? O que significava aquelas sombras, aqueles planos escuros, aqueles riscos tortuosos!? De vez em quando algo arredondado, de vez em quando um borrão, de vez em quando e novamente aquela imagem pouco conhecida. O médico, claro, sabia decifrar aquela imagem e tentava nos explicar a anatomia da bb e, baseando-me em sua empolgação (nunca vi um médico tão empolgado... rs), concluía que estava tudo bem.
Era a primeira USG (ultra-sonografia) que via, não a primeira de minha filha, mas a primeira de minha vida e lá estava ela, estava ali, num monitor menor do que uma tv de 14’ que tenho em casa e, ao mesmo tempo em que olhava para aquela imagem – que, com o tempo, passava a ser mais bem compreendida – olhava à mamãe deitada naquela maca. Eu fazia uma espécie de comparação, olhava a barriga (ainda pequena) e olhava ao monitor... olhava aquela imagem mexendo e aquele ventre e tentava imaginar a Maria (aquela imagem) dentro da mamãe...
Olhava a Maria dentro daquele monitor enquanto um filme tão confuso quanto aquelas imagens passava-se em minha mente. Pensava na vida, na tecnologia, na biologia... no amor... muita coisa, na verdade, passavam-se em minha cabeça até q disse a mim mesmo: “Minha filha está aqui, ela está aqui”, pensava, enquanto olhava a barriga e, por mais que as imagens fossem tortuosas e meus pensamentos idem, eu concluí: “Ela existe!”. Ela estava lá e aquele momento foi o primeiro, desde de o início, que tive plena certeza de que seria pai, de que a Maria, de fato, existia e estava a crescer dentro do ventre daquela muié ali deitada (e que eu tanto amava). Naquela hora, quando conclui concretamente que a Maria existia, me veio um misto de felicidade e insegurança, uma emoção (contida) que me fazia mais homem, mais responsável, que me fazia mais forte, mas que, ao mesmo tempo, me trazia a tal insegurança... “será que serei forte suficiente?! Será que estou pronto pra esta responsa!?”. Queria rir, chorar, falar que amava aquilo, que amava aquela imagem, aquela barriga, que amava minha filha e minha linda mamãe, mas, por um motivo que desconheço, contive td o que sentia e guardei dentro de mim...
Meus pensamentos foram abruptamente interrompidos quando a mamãe perguntou o séquiço e o médico disse com, segundo o próprio, 90% de certeza: Menina!!! “Eu sabia!!!”, pensei... e sabia mesmo! A mamãe tinha menos certeza do que muá, mas muá tinha certeza... rs
Naquela noite chorei muito, muito mesmo... talvez fosse emoção contida se aflorando... talvez fosse uma manifestação de felicidade, de alegria em contraste com a insegurança e a responsabilidade de ser pai...
Ali estava nossa filhota, nossa bebezinha, nossa imagem que começava a se formar de uma maneira mais concreta. A imagem de uma vida...
[Alair]